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Nessa história há duas personagens distintas: uma se chama Janis Oliveira e a outra Morena do Doce. Tanto uma quanto a outra é vencedora da primeira temporada do ‘Self-Made Brasil’, reality show voltado para o empreendedorismo gastronômico transmitido pelo canal Sony Channel e apresentado pela atriz Sheron Menezzes. Competindo com três participantes de outras regiões do país, durante a programação a paratiense contou um pouco da própria história e apresentou a geleia de juçara, produto que comercializa também na feira do Produtor Rural, às sextas-feiras, aqui em Paraty.
Por ser um alimento simbólico na cadeia alimentar da Mata Atlântica e valoroso do ponto de vista cultural e da preservação, Morena captou a importância por trás dessa mistura e conseguiu convencer os avaliadores Guga Rocha, chef gastronômico, Fernando Andreazi e Monique Evelle, ambos empreendedores. Com o prêmio que não imaginava ganhar, porque estava focada em compartilhar a trajetória de vida, a campeã vai continuar investindo na construção e adequação da cozinha da casa onde mora e, mais adiante, pretende criar mini fábrica e comercializar além dos próprios produtos, itens de outros produtores da agricultura familiar, estimulando a economia criativa local e ajudando parceiros do setor.
Mas, afinal, qual a diferença entre Janis e Morena? Vamos esclarecer essa questão antes de contar mais detalhes sobre a passagem empolgante no 'Self-Made Brasil' neste mês de dezembro.
Então! A primeira é dona de casa, companheira, mãe de três filhos, mulher. Enquanto a segunda reflete o lado empresária, comunicativa, vendedora, conhecida entre os colegas e disposta a vencer desafios. "A Janis é uma pessoa que batalhou muito para chegar onde chegou hoje. É uma mulher que nunca deixa a peteca cair. A Morena é uma empreendedora que começou seu próprio negócio à base de um sonho. É uma pessoa humilde e que vai ser uma grande empresária, não só aqui na cidade, mas no Brasil inteiro", disse emocionada ao relembrar dificuldades na juventude, mas superadas atualmente.

Foi a primeira vez que participou de uma competição, mas agora está de olho em outras oportunidades. No reality do Sony Channel Brasil, o convite surgiu despretensiosamente. Inicialmente, tanto ela quanto o marido desconfiaram da proposta feita por telefone motivados pela falta de detalhes. Ao menos, Morena sabia que estava sendo observada através das redes sociais, assim como as poucas informações que tinha não poderiam ser contadas para outras pessoas além do núcleo familiar. A confirmação veio em junho após seleção final, mas a gravação aconteceu em setembro, na grande São Paulo, mantendo o mesmo sigilo público para evitar "spoilers". "Eu fui com esperança de contar a minha história e mostrar meu trabalho. Eu não estava acreditando que ia vencer. Não pelo meu produto, mas porque tinha participantes, que conheci no hotel, que sabiam falar melhor que eu. Eram mais profissionais". Por falar em hotel, Morena foi tratada com a importância que merece ter. Em instantes, mais detalhes sobre o assunto.
Quando os amigos, parceiros e pessoas até então desconhecidas souberam da conquista, após a transmissão na tevê a cabo, lotaram os meios digitais da empresária com mensagens de apoio, carinho e admiração. Os familiares acreditaram na vitória antes dela e dos demais. "Muita gente me mandando mensagem no Whatsapp, me ligando, me dando os parabéns e que elas se inspiravam em mim; me dizendo que eu era um espelho de mulher negra empreendedora e aquilo [vitória] dava força para elas continuarem e não desistirem. Nisso eu fiquei muito feliz". Pegando o gancho da representatividade e o quanto isso importa, durante o programa era perceptível enxergar mulheres negras ocupando a cena com certo protagonismo: uma apresentadora, outra co-apresentadora, a participante da Bahia e a paratiense ganhadora do prêmio. Assim como a geleia de juçara e a gastronomia de Paraty marcaram presença, os conhecimentos e habilidades da cultura negra também receberam sua parcela de atenção.

Já que o assunto é atenção, Janis disse: "Foram carinhosos comigo do começo ao fim. Uma equipe muito acolhedora. Me senti importante". Da saída da cidade até o estúdio em São Paulo, foi guiada e assessorada como uma estrela – não que não seja, porque é. Morena teve carro reservado, assistência, hotel, jantar e tudo pago pela produção da emissora! Na noite anterior ao da gravação, ela e os outros três competidores passaram um tempo juntos falando do percurso individual e um pouco das receitas escolhidas. A amizade foi tão bacana que trocaram contato e se falam diariamente até hoje. Além do produto ganhador, foi apresentado a receita de abará, feito pela Martinha, o picadinho de carne, da Marisa Langella, e o bombom vegano de caramelo, produzido pelo Marcos Souza.
Dentre muitas receitas e doces produzidos por Morena, a decisão pela geleia de juçara veio depois de uma dúvida. "Na minha cabeça, não sabia se levaria doce ou salgado. Eu estava pensando em levar o antepasto de banana verde que é feito com a casca e biomassa. Também ia levar a geleia de cupuaçu, mas aí pensei: 'Já sei o que vou levar. Vou levar o juçara que é o açaí nativo da nossa Mata Atlântica e que está em extinção". Para ela, colher esse fruto parente do açaí é uma atividade cultural e deve ser mantida assim, respeitando o tempo e a produção. Ou seja, se já cuidava antes do prêmio, agora deseja despertar nos outros o mesmo olhar atento e interessado no futuro.

Ao entrar para gravar, um dos primeiros pensamentos que veio à mente foi o de pedir a Deus direcionamento na fala e no comportamento porque, como foi dito, Morena queria narrar a própria história para o Brasil, mas ficava reticente quanto às técnicas e aos traquejos dos concorrentes perante as câmeras. A Cultura, a economia criativa e a agricultura familiar agradecem a Janis e Morena por difundirem parte dos conhecimentos locais, tornando o título de Cidade Criativa da Gastronomia (UNESCO) ainda mais vivo. Parabéns por trazer outra vitória para Paraty.
O apoio da Secretaria de Cultura e as políticas culturais dos últimos anos na cidade, de acordo com a também agricultora Janis Oliveira, são ações importantes para o desenvolvimento dos produtos feitos por ela, assim como tem auxiliado diferentes pessoas cadastradas no sistema cultural. "O meu produto não tinha rótulo, não tinha data e o pessoal da Cultura me ajudou nisso. Eles foram lá, me ajudaram, fizeram rótulo novo e tudo". Parceira da agricultura familiar como a Angeli Temperos, figura simbólica na gastronomia paratiense, a colega foi outro canal que conduziu Morena até o Cadastro Cultural e políticas oferecidas pelo município.
A vencedora da primeira temporada do 'Self-Made Brasil' destacou também o 'Programa CriAtividades', iniciativa interessada, durante a primeira fase, na capacitação e formação de profissionais da gastronomia. Gerando quase meio milhão de reais em 2022, o programa já está sendo revertido em economia para as famílias. "Mulheres caiçaras, paratienses, negras, estarem ali vendendo seus produtos num evento no Centro Histórico é demais. É ter autonomia". A Secretaria de Cultura, juntamente a Prefeitura de Paraty, tem buscado tornar fixa a participação dessas alunas e dos integrantes do Programa de Produção Artesanal durante outros eventos oficiais da cidade.

Foi através das ações promovidas pela Cultura, no estímulo à política cultural, que Morena do Doce começou, por exemplo, a perceber como deve ser uma cozinha própria para o preparo dos produtos que comercializa. A compra dos novos equipamentos tem como base o que foi aprendido no Programa 'CriAtividadades', com a chef Luciana Guimarães. "Abriu minha mente". Outro destaque diz respeito ao título de Cidade Criativa da Gastronomia, reconhecido pela UNESCO em 2017. Depois da titulação, Janis disse que agora defender os valores da comida paratiense se tornou orgulho. "A gente fala das nossas receitas com mais carinho". E isso é percebido em todo canto em que elas e eles estão.
Perguntada sobre manias na cozinha, Morena afirmou ter segredos guardados a sete chaves, compartilhados apenas com os filhos. Mas sobre repassar os conhecimentos gastronômicos ao demais, essa é uma movimentação feita com frequência, porque só assim a história, o manejo e o sabor alcançarão as próximas gerações. Isso também é política cultural, concorda?
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Texto por: Matheus Ruffino
Imagens: Guido Ferreira/Self-Made Brasil
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